Dilma como sucessora de Lula
A posse de FHC chegou a ser saudada pelo principal órgão tucano na imprensa com um caderno especial que anunciava a “Era FHC” – deferência que Lula que, sim, instaurou uma nova era no país, não recebeu – e que se perdeu na intranscendência, quando foi ficando claro que FHC era apenas o capitulo nacional dos presidentes neoliberais da região, acompanhando a Menem, Fujimori, Carlos Andrés Perez, Salinas de Gortari, entre outros, no fracasso e na derrota.
O balanço dos 100 primeiros dias de Lula prenunciava as armadilhas em que cairiam seus críticos, tanto à direita, como à esquerda. Os primeiros buscaram desconstruir sua imagem de representante do movimento popular, dando ênfase à continuidade e à dissolução assim das novidades tanto tempo anunciadas pelo PT, especialmente a prioridade do social.
O enigma Lula – título do capitulo do meu livro “A nova toupeira” que analisa o "decifra-me ou te devoro" em que constituiu Lula para seus adversários – não tardaria em descolocar esses críticos de direita e de ultraesquerda e derrotar a ambos.
Ambos foram derrotados, quando ficou claro que os 100 primeiros dias eram transição da “herança maldita” – uma espécie de acumulação primitiva – para a geração das condições de um modelo econômico e social de retomada do desenvolvimento e de distribuição de renda, que responderia pelo sucesso inquestionável dos dois governos Lula.
Os 100 dias do governo Dilma são inéditos, por serem continuidade de um governo e de uma liderança de sucesso inéditos no Brasil e, de alguma forma (como apontou Perry Anderson em seu artigo sobre O Brasil de Lula, na London Review of Books), no mundo.
Da mesma forma que a anunciada ruptura de Lula em relação a FHC fez com que se pusesse a ênfase nos elementos de continuidade, deixando de lado as rupturas na politica internacional – com a consequente e transcendental reinserção do Brasil no campo internacional – e as novas politicas sociais que começavam a se esboçar e a ganhar prioridade -, agora se busca destacar as diferenças.
Os elementos essenciais do governo Lula se mantem e se reforçam com Dilma: o modelo econômico e social sofre as adequações que o próprio Lula teria feito, a partir de elementos novos, como a conjuntura econômica internacional, com os fatores cambiários em continuidade com o peso que foram tendo ao longo dos últimos dois anos, em particular.
Da mesma forma que as politicas sociais preservam seu papel central no modelo que articula o eixo fundamental do governo: desenvolvimento com combate às desigualdades sociais.
As mudanças tem que ser abordadas no seu marco específico.
Os problemas – que abordaremos em artigo posterior – têm que ser abordados neste marco: o da continuidade do governo Dilma com o governo Lula, para não se perder em visões impressionantes, ou que isolem aspectos parciais da totalidade do governo ou que se deixem levar por fáceis abordagens jornalísticas – que costumam cair na visão descritiva, nas aparências, sem capacidade de analise politica de fundo e na proporção de vida, das questões.
Os problemas – para enunciá-los já – residem na área econômica: nas dificuldades das medidas de adequação, sem colocar em risco os objetivos centrais do governo.
Mas o principal avanço do governo Dilma está na sua capacidade de ampliar o potencial hegemônico do governo, isto é, de manter o eixo essencial das politicas que marcaram o governo Lula, em um marco de alianças e de legitimidade social e politica mais ampla, estendendo a capacidade de diálogo e interlocução com outros setores sociais – como a classe média –, assim como com a oposição.
É esse o cenário em que deve ser avaliado o governo Dilma, nos seus avanços e nos problemas que têm pela frente, nos seus milhares de outros dias.
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